domingo, 1 de abril de 2007

Projeto de lei teatral racha categoria e atinge governo Lula

O teatro brasileiro está rachado. Dois grupos formados por atores, diretores e produtores estão em lados opostos para criar uma política pública para o teatro no país. Eles elaboraram dois projetos distintos para o setor, que já foram enviados ao Congresso.
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Grupos vinculados ao Redemoinho - movimento que reúne cerca de cem conjuntos teatrais brasileiros - e a Cooperativa Paulista de Teatro apresentaram à Câmara dos Deputados projeto denominado "Programa do fomento ao teatro brasileiro" .
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O texto prevê a criação de um fundo no valor de R$ 78 milhões a ser administrado e distribuído pela Funarte (Fundação Nacional das Artes) a 465 grupos de teatro de todo o Brasil a cada ano. A condição para participar do edital e concorrer a um quinhão deste montante é que os grupos existam há pelo menos três anos.
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Do outro lado, produtores de São Paulo e do Rio de Janeiro - acompanhados de atores como Regina Duarte, Irene Ravache, Marcos Nanini e Nicete Bruno - defendem um projeto intitulado "Lei geral do teatro" , apresentado ao Senado Federal em março, que prevê a criação da Secretaria Nacional do Teatro vinculada ao Ministério da Cultura e à desburocratização da Lei Rouanet.
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O presidente da Funarte, Celso Frateschi, também ator e produtor teatral, foi um dos primeiros a jogar lenha na fogueira. Disse ser contra a criação da Secretaria Nacional do Teatro, que causaria duplicação e descaracterização da estrutura do MinC, além de inchar a máquina estatal. Frateschi foi ainda mais duro com a proposta de captação de recursos via Lei Rouanet.
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"Não acreditamos que a radicalização da Lei Rouanet, como é proposta pela 'Lei geral do teatro', seja uma solução. Ao contrário, isto só vai radicalizar falhas que já existem - tais como a centralização de recursos no eixo Rio/São Paulo, a diminuição de sessões por temporada e o descuido com a formação de público", disse Frateschi, apresentando números para provar as distorções produzidas por quase duas décadas de Lei Rouanet.
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Segundo o presidente da Funarte, 2.229 municípios brasileiros têm atividade teatral. No entanto, 80,4% dos recursos captados via Lei Rouanet foram destinados à produção teatral do eixo Rio/São Paulo.
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Antes da criação da Lei Rouanet, a média de sessões por temporada era de seis a oito por semana. Após a criação da lei de incentivo fical, esse número caiu para duas a três apresentações semanais. Na interpretação de Frateschi, o dado significa que é mais fácil lucrar com a montagem de um espetáculo do que em sua bilheteria.
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Outra voz contrária à "Lei geral do teatro" é a de Ney Piacentini, presidente da Cooperativa Paulista de Teatro. "É retrógrada a proposta de mais uma lei de incentivo fiscal, desta vez exclusiva para o teatro", disse Piacentini, que, no entanto, acha que a criação de uma secretaria nacional de teatro deve ser debatida. "Talvez o teatro mereça um espaço específico no MinC."
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Enquanto o governo vai a público criticar a Lei Rouanet e, na prática, segundo produtores, cria mecanismos para dificultar a aprovação de projetos para captar por meio dela, nem todos estão convencidos de que o melhor caminho seja extingui-la. "Não queremos só Lei Rouanet. Ninguém quer ser refém do incentivo fiscal. Mas por enquanto, é só o que temos. Batalhamos por melhorias", declara o produtor Eduardo Barata.
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"Não estamos mexendo no orçamento do MinC, nem no teto da renúncia fiscal. E a Lei Rouanet não é só o mecenato (o incentivo fiscal). Ela também tem o Fundo Nacional de Cultura (FNC), que neste ano tem R$ 325 milhões para distribuir. É muito dinheiro, quase metade do que se capta por ano no mecenato", agrega Barata, criticando o projeto apresentado por Frateschi de criação de um Fundo Geral das Artes, que o governo deve implementar até julho de 2008.
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O presidente da Funarte informou que os recursos do Fundo Geral das Artes serão destinados a atividades artísticas que normalmente não conseguem patrocínio da iniciativa privada, como por exemplo trabalhos de pesquisa de linguagem.
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Já a diretora Cibele Forjaz gostaria de ver a conciliação entre os dois grupos e a junção dos dois projetos. Ela alerta que se a categoria não se juntar, o sonho de conquistar uma política de estado para o teatro pode dar em nada. "São formas de produção muito diferentes. Um produtor capta recursos e chama uma equipe para montar a peça e trabalhar. Já uma cooperativa ou um grupo faz um trabalho conjunto de pesquisa, que necessita de financiamento de longo prazo".
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Lembrando que nos dois grupos existem os que querem dialogar e os que querem radicalizar, Cibele avalia que "todos devem ter direito de buscar recursos e trabalhar. Temos que nos entender e o MinC precisa entender que há diferentes formas de fazer teatro." A opinião é compartilhada por Ivan Cabral, um dos fundadores do grupo Os Satyros.
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"Juca de Oliveira e Bibi Ferreira são fundamentais para nossa cultura, assim como o trabalho de grupos como Os Satyros. Todos precisam ter possibilidade de trabalho", sublinha Cabral. "Cirque du Soleil também precisa vir ao Brasil. Minha mãe adora (risos). O que acontece agora é que a Lei Rouanet inviabiliza meu trabalho, mas possibilita o trabalho de Juca e Bibi e a vinda do Soleil."
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Já para o consagrado diretor mineiro Gabriel Villela, o "Programa do fomento ao teatro brasileiro" parece esquecer que o teatro brasileiro não é feito apenas por grupos. "Isto é até inconstitucional. O governo não pode definir como Fernanda Montenegro vai fazer teatro".
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Na opinião de Villela, o teatro - mesmo quando feito por um indivíduo - "é sempre uma arte coletiva". Segundo ele, "da maneira como prevê o 'Programa do fomento ao teatro brasileiro', ou você perde o que tem de mais caro, que é sua rubrica de artista, em nome de um grupo, ou não poderá mais trabalhar. Tem que ter espaço para tudo e respeitar a constituição".
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Da Redação do Vermelho

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